quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Quem paga o enterro?

Houve um tempo em que morrer de amor era considerado bonito, um exemplo de fidelidade, um exemplo de amor verdadeiro. Consigo imaginar as pessoas comentando:
-Isadora, filha da Aninha, morreu ontem.
-Morreu? Do que?
-Morreu de amor, desde que Gustavo da Chiquinha foi embora ela estava definhando, tadinha, não comia, não bebia...
Um diálogo no mínimo estranho, porém existem piores, um exemplo é da mulher de uma cidade do interior do Ceará que ficou, dizem as más línguas, esperando até o dia de sua morte o amor da vida dela sentada na janela com um vestido de noiva. O mesmo já ouvi dizer de Manoela de Paula Ferreira, ex-amante de Garibaldi, que trocada por Anita, que viria a se tornar Anita Garibaldi, jamais se esqueceu de Garibaldi e o esperou até o fim dos dias na janela da estância de vestido de noiva. Imagens poéticas para colorir o sofrimento e as dores que o amor causam, e claro, mais uma vez reafirmar a beleza de se sofrer por amor, coisa antiga já feita por trovadores na idade média. Malditos trovadores, talvez se não fossem eles esse texto nem estaria sendo escrito por que nós nem veríamos o amor como vemos.
O fato é que hoje em dia amar e ser amado é artigo de luxo, morrer de amor então é para quem pode pagar por isso, em outras palavras como já dizia a poetisa Natasha Anythisk “Amor demais é falta do que fazer”. Morrer por amor além de ter virado uma lenda (assim como o próprio amor, que para muitos é igual Caviar “nunca vi, nem comi, eu só ouço falar”) não é algo prático, digamos que é considerado uma grande frescura. Vivemos em um mundo onde essas coisas de sentimento em excesso não são bem vistos, pessoas muito afetuosas, muito meigas infelizmente muitas vezes não se dão bem na vida, todos nós já vimos uma situação onde pessoas encontram alguém que os ame perdidamente e faz tudo por elas, a primeira atitude delas é ignorar a pessoa e desfazer dela. A maioria das pessoas não sabem ser amadas, porém isso, talvez, seja assunto para outro texto. O fato é eu vivemos em um mundo prático e rápido, se você escolhe definhar em uma cama então é bom que tenha alguém pra pagar seu aluguel ou suas contas, você não pode simplesmente chegar no supermercado e dizer que está sofrendo de amor portanto não irá pagar as compras, ninguém te deixaria em paz para morrer por amor, e seu sofrimento seria menosprezado e viraria motivo de piada para todos. Fico imaginando que se alguém chegar para mim e dizer que alguém morreu de amor minha primeira atitude seria rir, e uns dez minutos depois, talvez, eu diria que sinto muito, se o caso fosse comigo, ou seja, eu morrer de amor, minha mãe me mataria depois de morta e diria ”Isso menina é para você aprender a não ser burra”.
Amor de homem para mulher apenas sei que existe por que já vi mais de um caso de casais que se amam, por que não existe outra explicação para o que eles sentem e de como agem um com o outro. Eu mesma nunca fui amada por homem nenhum. Menos mal, sei que ninguém vai morrer por mim.
Em contrapartida, por incrível que possa parecer, uma Universidade da Califórnia descobriu que isso existe, e que as pessoas podem morrer de amor, e morrem. Segundo eles a pessoa tem algo parecido com um infarto de simplesmente desfalece. A mesma universidade vem a anos tentando provar cientificamente que o amor existe, e que é uma fusão de processos químicos que ocorrem no corpo e cérebro. Claro que a imagem de processos químicos é bem menos romântica que a de uma senhora vestida de noiva esperando o amor de sua vida, e eu até acredito que ambos acontecem.
Porém com ciência ou sem ciência o fato é que até morrer de amor hoje em dia nos foi vetado e não é considerado bonito ou emocionante e sim uma eterna burrice, nunca vi ninguém morrer por amor nos dias de hoje. Eu, particularmente, caso seja acometida por tal doença num mundo frio e calculista como o que vivemos só me questiono o seguinte: quem pagará o enterro e as flores se eu morrer de amores?[1] E como já sei que a resposta é ninguém, prefiro nem imaginar em me envolver, para não ter esses problemas chatos e dar mais trabalho morta do que dei em vida.




[1] Vínicius de Moraes, Hora íntima.

Nenhum comentário:

Postar um comentário